E porque hoje o Mundo tem os olhos postos nos EUA
Vou colocar alguns excertos de uma carta. A versão integral está aqui.
Sou um escritor de uma nação pobre, um país que já esteve na vossa lista negra.
Milhões de moçambicanos desconheciam que mal vos tínhamos feito.
Éramos pequenos e pobres: que ameaça poderíamos constituir?
A nossa arma de destruição massiva estava, afinal, virada contra nós:
era a fome e a miséria.
(...)
Acordei do pesadelo do sono para o pesadelo da realidade. A guerra que o Senhor Presidente teimou em iniciar poderá libertar-nos de um ditador. Mas ficaremos todos mais pobres. Enfrentaremos maiores dificuldades nas nossas já precárias economias e teremos menos esperança num futuro governado pela razão e pela moral. Teremos menos fé na força reguladora das Nações Unidas e das convenções do direito internacional. Estaremos, enfim, mais sós e mais desamparados.
(...)
CARTA de Mia Couto AO RESIDENTE BUSH
Senhor Presidente:
Senhor Presidente:
Sou um escritor de uma nação pobre, um país que já esteve na vossa lista negra.
Milhões de moçambicanos desconheciam que mal vos tínhamos feito.
Éramos pequenos e pobres: que ameaça poderíamos constituir?
A nossa arma de destruição massiva estava, afinal, virada contra nós:
era a fome e a miséria.
(...)
um país que não conseguia dormir.
Porque vivia sobressaltado por terríveis factos.
E esse temor fez com que proclamasse uma exigência.
Uma exigência que tinha a ver consigo, Caro presidente.
E eu exigia que os Estados Unidos da América procedessem à eliminação
do seu armamento de destruição massiva.
(...)
Porque vivia sobressaltado por terríveis factos.
E esse temor fez com que proclamasse uma exigência.
Uma exigência que tinha a ver consigo, Caro presidente.
E eu exigia que os Estados Unidos da América procedessem à eliminação
do seu armamento de destruição massiva.
(...)
A lista é tão grande que escolherei apenas alguns:
- Os Estados Unidos foram a única nação do mundo que lançou bombas atómicas
sobre outras nações;
- O seu país foi a única nação a ser condenada por "uso ilegítimo da força"
pelo Tribunal Internacional de Justiça;
- Forças americanas treinaram e armaram fundamentalistas islâmicos mais extremistas
(incluindo o terrorista Bin Laden) a pretextode derrubarem os invasores russos no Afeganistão;
- O regime de Saddam Hussein foi apoiado pelos EUA enquantopraticava as piores atrocidades contra os iraquianos (incluindo o gaseamento dos curdos em 1998);
- Como tantos outros dirigentes legítimos, o africano Patrice Lumumba foi assassinado com ajuda da CIA. Depois de preso e torturado e baleado na cabeça o seu corpo foi dissolvido em ácido clorídrico;
- Como tantos outros fantoches, Mobutu Seseseko foi por vossos agentes conduzido ao poder e concedeu facilidades especiais à espionagem americana: o quartel-general da CIA no Zaire tornou-se o maior em África. A ditadura brutal deste zairense não mereceu nenhum reparo dos EUA até que ele deixou de ser conveniente, em 1992;
- A invasão de Timor Leste pelos militares indonésios mereceu o apoio dos EUA. Quando as atrocidades foram conhecidas, a resposta da Administração Clinton foi "o assunto é da responsabilidade do governo indonésio e não queremos retirar-lhe essa responsabilidade";
- O vosso país albergou criminosos como Emmanuel Constant um dos líderes mais sanguinários do Taiti cujas forças para-militares massacraram milhares de inocentes. Constant foi julgado à revelia e as novas autoridades solicitaram a sua extradição. O governo americano recusou o pedido;
- Em Agosto de 1998, a força aérea dos EUA bombardeou no Sudão uma fábrica de medicamentos, designada Al-Shifa. Um engano? Não, tratava-se de uma retaliação dos atentados bombistas de Nairobi e Dar-es-Saalam.
- Em Dezembro de 1987, os Estados Unidos foi o único país (junto com Israel) a votar contra uma moção de condenação ao terrorismo internacional. Mesmo assim, a moção foi aprovada pelo voto de cento e cinquenta e três países.
- Em 1953, a CIA ajudou a preparar o golpe de Estado contra o Irão na sequência do qual milhares de comunistas do Tudeh foram massacrados.
- A lista de golpes preparados pela CIA é bem longa. Desde a Segunda Guerra Mundial, os EUA bombardearam: a China(1945-46), a Coreia e a China (1950-53), a Guatemala (1954), a Indonésia (1958), Cuba (1959-1961), a Guatemala (1960), o Congo(1964), o Peru(1965), o Laos (1961-1973), o Vietname (1961-1973), o Camboja(1969-1970), a Guatemala (1967-1973), Granada (1983),Líbano(1983-1984), a Líbia (1986), Salvador (1980), a Nicarágua(1980), o Irão (1987), o Panamá (1989), o Iraque (1990-2001), o
Kuwait (1991), a Somália (1993), a Bósnia (1994-95), o Sudão (1998), o Afeganistão (1998), a Jugoslávia (1999) Acções de terrorismo biológico e químico foram postas em prática pelos EUA: o agente laranja e os desfolhantes no Vietname, o vírus da peste contra Cuba que durante anos devastou a produção suína naquele país. O Wall Street Journal publicou um relatório que anunciava que 500 000 crianças vietnamitas nasceram deformadas em consequência da guerra química das forças norte-americanas.
- Os Estados Unidos foram a única nação do mundo que lançou bombas atómicas
sobre outras nações;
- O seu país foi a única nação a ser condenada por "uso ilegítimo da força"
pelo Tribunal Internacional de Justiça;
- Forças americanas treinaram e armaram fundamentalistas islâmicos mais extremistas
(incluindo o terrorista Bin Laden) a pretextode derrubarem os invasores russos no Afeganistão;
- O regime de Saddam Hussein foi apoiado pelos EUA enquantopraticava as piores atrocidades contra os iraquianos (incluindo o gaseamento dos curdos em 1998);
- Como tantos outros dirigentes legítimos, o africano Patrice Lumumba foi assassinado com ajuda da CIA. Depois de preso e torturado e baleado na cabeça o seu corpo foi dissolvido em ácido clorídrico;
- Como tantos outros fantoches, Mobutu Seseseko foi por vossos agentes conduzido ao poder e concedeu facilidades especiais à espionagem americana: o quartel-general da CIA no Zaire tornou-se o maior em África. A ditadura brutal deste zairense não mereceu nenhum reparo dos EUA até que ele deixou de ser conveniente, em 1992;
- A invasão de Timor Leste pelos militares indonésios mereceu o apoio dos EUA. Quando as atrocidades foram conhecidas, a resposta da Administração Clinton foi "o assunto é da responsabilidade do governo indonésio e não queremos retirar-lhe essa responsabilidade";
- O vosso país albergou criminosos como Emmanuel Constant um dos líderes mais sanguinários do Taiti cujas forças para-militares massacraram milhares de inocentes. Constant foi julgado à revelia e as novas autoridades solicitaram a sua extradição. O governo americano recusou o pedido;
- Em Agosto de 1998, a força aérea dos EUA bombardeou no Sudão uma fábrica de medicamentos, designada Al-Shifa. Um engano? Não, tratava-se de uma retaliação dos atentados bombistas de Nairobi e Dar-es-Saalam.
- Em Dezembro de 1987, os Estados Unidos foi o único país (junto com Israel) a votar contra uma moção de condenação ao terrorismo internacional. Mesmo assim, a moção foi aprovada pelo voto de cento e cinquenta e três países.
- Em 1953, a CIA ajudou a preparar o golpe de Estado contra o Irão na sequência do qual milhares de comunistas do Tudeh foram massacrados.
- A lista de golpes preparados pela CIA é bem longa. Desde a Segunda Guerra Mundial, os EUA bombardearam: a China(1945-46), a Coreia e a China (1950-53), a Guatemala (1954), a Indonésia (1958), Cuba (1959-1961), a Guatemala (1960), o Congo(1964), o Peru(1965), o Laos (1961-1973), o Vietname (1961-1973), o Camboja(1969-1970), a Guatemala (1967-1973), Granada (1983),Líbano(1983-1984), a Líbia (1986), Salvador (1980), a Nicarágua(1980), o Irão (1987), o Panamá (1989), o Iraque (1990-2001), o
Kuwait (1991), a Somália (1993), a Bósnia (1994-95), o Sudão (1998), o Afeganistão (1998), a Jugoslávia (1999) Acções de terrorismo biológico e químico foram postas em prática pelos EUA: o agente laranja e os desfolhantes no Vietname, o vírus da peste contra Cuba que durante anos devastou a produção suína naquele país. O Wall Street Journal publicou um relatório que anunciava que 500 000 crianças vietnamitas nasceram deformadas em consequência da guerra química das forças norte-americanas.
Acordei do pesadelo do sono para o pesadelo da realidade. A guerra que o Senhor Presidente teimou em iniciar poderá libertar-nos de um ditador. Mas ficaremos todos mais pobres. Enfrentaremos maiores dificuldades nas nossas já precárias economias e teremos menos esperança num futuro governado pela razão e pela moral. Teremos menos fé na força reguladora das Nações Unidas e das convenções do direito internacional. Estaremos, enfim, mais sós e mais desamparados.
(...)
Livrar-nos-emos de Saddam. Mas continuaremos prisioneiros da lógica da guerra e da arrogância. Não quero que os meus filhos (nem os seus) vivam dominados pelo fantasma do medo. E que pensem que, para viverem tranquilos, precisam de construir uma fortaleza. E que só estarão seguros quando se tiver que gastar fortunas em armas. Como o seu país que
despende 270 000 000 000 000 dólares (duzentos e setenta biliões de dólares) por ano para manter o arsenal de guerra. O senhor bem sabe o que essa soma poderia ajudar a mudar o destino miserável de milhões de seres.
despende 270 000 000 000 000 dólares (duzentos e setenta biliões de dólares) por ano para manter o arsenal de guerra. O senhor bem sabe o que essa soma poderia ajudar a mudar o destino miserável de milhões de seres.
O bispo americano Monsenhor Robert Bowan escreveu- lhe no final do ano passado uma carta intitulada "Porque é que o mundo odeia os EUA ?" O bispo da Igreja Católica da Florida é um ex - combatente na guerra do Vietname.
Ele sabe o que é a guerra e escreveu: "O senhor reclama que os EUA são alvo do terrorismo porque defendemos a democracia, a liberdade e os direitos humanos. Que absurdo, Sr. Presidente ! Somos salvos dos terroristas porque, na maior parte do mundo, o nosso governo defendeu a ditadura, a escravidão e a exploração humana. Somos alvos dos terroristas porque somos odiados. E somos odiados porque o nosso governo fez coisas odiosas. Em quantos países agentes do nosso governo depuseram líderes popularmente
eleitos substituindo-os por ditadores militares, fantoches desejosos de vender o seu próprio povo às corporações norte-americanas multinacionais ?
E o bispo conclui:
O povo do Canadá desfruta de democracia, de liberdade e de direitos humanos,
assim como o povo da Noruega e da Suécia.
Alguma vez o senhor ouviu falar de ataques a embaixadas canadianas, norueguesas ou suecas?
Nós somos odiados não porque praticamos a democracia, a liberdade ou os direitos humanos.
Somos odiados porque o nosso governo nega essas coisas aos povos dos países do Terceiro Mundo, cujos recursos são cobiçados pelas nossas multinacionais."
(...)
Ele sabe o que é a guerra e escreveu: "O senhor reclama que os EUA são alvo do terrorismo porque defendemos a democracia, a liberdade e os direitos humanos. Que absurdo, Sr. Presidente ! Somos salvos dos terroristas porque, na maior parte do mundo, o nosso governo defendeu a ditadura, a escravidão e a exploração humana. Somos alvos dos terroristas porque somos odiados. E somos odiados porque o nosso governo fez coisas odiosas. Em quantos países agentes do nosso governo depuseram líderes popularmente
eleitos substituindo-os por ditadores militares, fantoches desejosos de vender o seu próprio povo às corporações norte-americanas multinacionais ?
E o bispo conclui:
O povo do Canadá desfruta de democracia, de liberdade e de direitos humanos,
assim como o povo da Noruega e da Suécia.
Alguma vez o senhor ouviu falar de ataques a embaixadas canadianas, norueguesas ou suecas?
Nós somos odiados não porque praticamos a democracia, a liberdade ou os direitos humanos.
Somos odiados porque o nosso governo nega essas coisas aos povos dos países do Terceiro Mundo, cujos recursos são cobiçados pelas nossas multinacionais."
(...)
A maior ameaça que pesa sobre a América não são armamentos de outros. É o universo de mentira que se criou em redor dos vossos cidadãos. O perigo não é o regime de Saddam, nem nenhum outro regime. Mas o sentimento de superioridade que parece animar o
seu governo. O seu inimigo principal não está fora. Está dentro dos EUA.
Essa guerra só pode ser vencida pelos próprios americanos. Eu gostaria de poder festejar o derrube de Saddam Hussein. E festejar com todos os americanos. Mas sem hipocrisia, sem argumentação e consumo de diminuídos mentais. Porque nós, caro Presidente Bush, nós, os povos dos países pequenos, temos uma arma de construção massiva:
seu governo. O seu inimigo principal não está fora. Está dentro dos EUA.
Essa guerra só pode ser vencida pelos próprios americanos. Eu gostaria de poder festejar o derrube de Saddam Hussein. E festejar com todos os americanos. Mas sem hipocrisia, sem argumentação e consumo de diminuídos mentais. Porque nós, caro Presidente Bush, nós, os povos dos países pequenos, temos uma arma de construção massiva:
a capacidade e pensar.
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